Sobre Moedas e Mulas
A melhor maneira de saber o que é uma coisa é primeiro saber o que ela não é.
[Itália, em algum lugar da Toscana.]
[Jerry tropeça para fora do táxi.]
JERRY: Você não precisava me empurrar.
KRAMER: Eu não empurrei você. Quanto você pagou a esse cara?
JERRY: 75.000 liras.
KRAMER: 75.000 liras?! Você está louco?!
JERRY: Kramer, você não entende a taxa de câmbio.
KRAMER: Oh, taxa de câmbio, oh.
JERRY: Sabe, eu nem sei porque eu trouxe você.
KRAMER: Ninguém colocou uma arma na sua cabeça.
— "The Maestro". Seinfeld, episódio 3 da sétima temporada.
Considerando a taxa de câmbio lira para dólares e a inflação de 1995 até 2023, Jerry pagou aproximadamente 95 dólares na corrida de taxi (mais todos os custos da viagem) para mostrar ao Maestro que, sim, ainda haviam casas na Toscana para serem alugadas. Apesar de não ser uma corrida barata, certamente não foram 95 dólares que deixaram Kramer espantado — ele realmente não entendia o sistema de conversão de moedas1. Mas, afinal, quem entende esse sistema? A conversão de moedas gera muita confusão e dificulta a realização de trocas entre pessoas que residem em áreas monetárias diferentes.
A magnitude da confusão e ineficiência econômica que a conversão provoca depende de alguns fatores. Um dos mais importante deles é o grau de integração entre as economias que tem moedas diferentes. Por exemplo, o prejuízo econômico da Alemanha adotar uma moeda diferente da Coreia do Norte é baixo, pois norte-coreanos e alemães raramente fazem negócios uns com os outros: não há uma troca significativa de bens entre eles, não existem muitos alemães indo trabalhar na Coreia do Norte, nem capital norte-coreano investindo em empresas na Alemanha e vice-versa. O mesmo não pode ser dito para as relações entre Alemanha e Bélgica, ou entre Alemanha, Holanda e França. Entre eles, há um fluxo intenso de produtos, pessoas e capital indo de um lado para o outro, ou seja, uma grande integração de suas economias. Nesse caso, o custo de transação de ter que lidar com marcos, francos, franco belga e florim holandês era alto o bastante para justificar uma unificação da moeda.
O uso da palavra “justificar” no paragrafo anterior sugere que talvez nem sempre o uso de uma moeda única entre duas regiões seja correto. Claro, existem razões geopolíticas pelas quais talvez não seja uma boa ideia compartilhar sua moeda com a Coreia do Norte, mas será que existem razões econômicas? Robert Mundell é o economista vencedor do prêmio Nobel que pensou sobre isso em seu artigo chamado A Theory of Optimum Currency Areas (Uma Teoria de Áreas Monetárias Ótimas em português). Nesse estudo, Mundell está preocupado em saber qual deve ser o tamanho da região na qual vigora uma mesma moeda. Em princípio, ela pode vigorar em apenas um país ou em vários, pode ser grande ou pequena. A libra esterlina vigora apenas na Inglaterra, enquanto o euro é adotado por dezenas de países. A questão é saber qual seria o tamanho ótimo. Como bom economista, Mundell pensa sobre esse problema em termos de benefícios e custos. O benefício de adotar uma moeda única é óbvio: são os ganhos de troca que surgem com a redução dos custos de transação. Mas quais são os custos? Bem, para entender isso precisamos voltar no tempo.
Velho Testamento
“As montanhas são altas demais para escalar, os rios largos demais para atravessá-los. É assim que as energias da natureza obstruem o espírito dos homem.”
— Cônsul britânico Lennon Hunt em seu relatório sobre comércio e trocas do Rio de Janeiro durante o ano de 1869. Extraído de Order Against Progress: Government, Foreign Investment, and Railroads in Brazil, 1854-1913.
Esse depoimento é apenas um dos que William Summerhill utilizou para ilustrar aos brasileiros do século XXI a situação de um viajante no Brasil no século XIX. No segundo capítulo do seu livro Order Against Progress (“Trilhos do Desenvolvimento” em português), o historiador econômico caracteriza a situação desesperadora do transporte no nosso país ao longo do seu primeiro século com nação independente. O capítulo começa com uma frase que resume bem o diagnóstico:
“Na metade do século XIX, o Brasil permanecia preso com uma tecnologia de transporte pouco diferente daquela encontrada no Velho Testamento.”
Enquanto as ferrovias começavam a aparecer no mundo, o transporte de mercadorias e pessoas no Brasil era feito no lombo de mulas2. Os comboios percorriam estradas rudimentares, muitas das quais, segundo Summerhill, foram herdadas de tribos indígenas e missionários. O animal preferido para percorrê-las eram mulas, pois elas eram as mais eficientes em termos econômicos e eram as que melhor enfrentavam o terreno.
A péssima qualidade das estradas é agravada pelo o que o depoimento do cônsul estrangeiro dá a entender. Suas frases capturam de forma poética a triste realidade brasileira: a péssima geografia do nosso país. O Brasil é um país de dimensões continentais3 com relevo muito ruim. Com exceção do Rio Grande do Sul e parte do Nordeste, nossa costa é repleta de montanhas e planaltos. A rugosidade do terreno, rente ao mar, dificulta o acesso ao interior, o que faz com que as atividades econômicas tendam a se concentrar nas cidades litorâneas. Ou seja, trata-se de um país continental cujo terreno dificulta a criação de estradas. “Certo”, você deve estar se perguntando, “mas e os rios?”. Sim, nós temos bastante rios, mas eles também têm problema.
Infelizmente, como destaca Summerhill, os rios brasileiros que são ao mesmo tempo extensos e navegáveis estão “no lugar errado”. Ou seja, eles não ligavam as zonas agrícolas férteis com os centros urbanos e portos. Para se ter uma comparação da falta de sorte brasileira, abra o Google Maps para ver o caminho que o rio Mississipi percorre ao longo dos Estados Unidos e depois tente achar um rio assim no Brasil (que seja navegável, lembre-se). Embora se usasse rios para transporte de bens e pessoas, este era limitado tanto no volume transportado quanto na extensão percorrida.
Um país com vasto território como o Brasil poderia, em tese, explorar mais facilmente ganhos de escala na agricultura, por exemplo. Além disso, esse mesmo gigantismo, em princípio, aumenta a extensão do mercado potencial e, com ela, o grau de especialização da economia. Ganhos de escala e especialização são fontes de aumento de produtividade, a qual é causa central da riqueza de uma nação. O problema é que a limitação do terreno impedia que o nosso país desfrutasse desse potencial. Ganhos de escala exigem acesso fácil ao interior e mercados integrados exigem baixos custos de transporte entre regiões. Um “gigante pela própria natureza” e, por essa mesma natureza, um país fragmentado — essa era a realidade do Brasil até quase o fim do século XIX.
Para se ter uma ideia do grau de desintegração, segundo o Summerhill, o custo de transportar minério de ferro de Minas Gerais por uma distância de 186km quase triplicava o preço do produto. Isso significava, na prática, que o mercado final dessa mercadoria era severamente limitado. E quanto menor o mercado para o produto, menor tenderá a ser sua escala de produção e, portanto, menor é a possibilidade de aproveitar ganhos de escala na sua produção. Além disso, as diversas regiões do Brasil não aproveitavam as vantagens comparativas umas das outras. Isso significa, por exemplo, que a região nordeste não podia comprar muitos produtos da região sul, mas, sim, teria que produzi-los internamente. Ou seja, havia um baixo grau de especialização da economia brasileira e, portanto, baixa produtividade4. Isso é especialmente verdade no caso da agricultura de alimentos para consumo interno, as quais, devido as limitações de transporte, eram destinadas a pequenos mercados ou para subsistência apenas.
Mas o que isso tem a ver com Área Monetária Ótima?
Os custos de adotar uma moeda comum podem ser ilustrados analisando uma situação em que eles aparecem de forma patológica. Uma situação diferente daquela observada entre França, Alemanha, Bélgica e Holanda. Temos que observar uma área em que exista uma moeda comum, mas cujas economias da região sejam desintegradas. Bem, essa era justamente a situação do Brasil no século XIX e, mais especificamente, essa era especialmente o caso das regiões sudeste e nordeste. Pelo menos essa é a teoria de outro grande historiador econômico que se dedicou a estudar o Brasil: Nathaniel Leff.
How Latin America Fell Behind ("Como América Latina Ficou Para Trás" em português) é uma coletânea com ensaios de história econômica do Brasil e do México durante o século XIX5. O segundo capítulo é um artigo em que Leff faz uma análise dos problemas enfrentados pela economia brasileira nesse período. Essa análise é necessária, segundo Leff, pois, em termos econômicos, o primeiro século da história de nosso país foi tão emocionante quanto ver tinta secar (ele não usou essas palavras, mas a ideia é essa). De acordo com estimativas do historiador econômico Angus Maddison, em 1800, o total produzido anualmente no país em termos per capita não foi muito diferente daquele produzido cem anos depois. Ou seja, o século XIX foi um século perdido em termos econômicos.
Segundo Leff, parte desse fenômeno é explicado pelo gradual empobrecimento da região nordeste do Brasil. Essa região sempre teve uma relevância fundamental na economia colonial brasileira e, no século XIX, isso não era diferente. A economia nordestina — assim como a brasileira — era alicerçada na exportação, sendo este o setor mais produtivo do país. Os produtos exportados naquela região eram açúcar e algodão. Ao longo do século XIX, no entanto, ambas produções tiveram um declínio significativo. O motivo, segundo Leff, residia na ascensão de um novo produto, dessa vez na região sudeste do país: o café. Ele explica:
O declínio da exportação de açúcar e algodão do nordeste refletiu o fato de que, o Brasil do século dezenove, tinha uma vantagem comparativa mais forte na produção de café do que açúcar e algodão. Isto é, uma unidade de moeda estrangeira poderia ser adquirida com menos recursos domésticos em termos de café do que em algodão e açúcar.
Nathaniel H. Leff. Economic Development in Brazil, 1822-1913.
Traduzindo em português, o Brasil conseguia comprar mais coisas do resto mundo produzindo café do que algodão e açúcar. Além disso, o crescimento das exportações de café na região sudeste aumentaram a entrada de moeda estrangeira no país. Quando isso acontece, há uma tendência de apreciação da moeda nacional em relação as demais. Essa apreciação, por sua vez, afeta a receita medida em Mil-réis (a moeda brasileira da época) dos exportadores de todas as comodities (algodão, café, açúcar e etc.). Quanto maior a apreciação da moeda, menor a receita das exportações medida em Mil-réis. Para contextualizar, se o dólar se desvaloriza em relação ao real, isso significa que quando você vende suas havaianas para um estrangeiro e ele te paga em dólares, na prática, você recebe menos reais do que receberia antes da desvalorização. A explosão do café, portanto, “prejudicava” os outros setores ao gerar uma apreciação real da moeda.
Até aí, não existem grandes problemas. Uma mudança na taxa de câmbio é uma mudança de um preço relativo. Numa economia de mercado, os preços sinalizam escassez relativa, informando os consumidores e produtores as melhores oportunidades para economizar ou lucrar. No contexto brasileiro da época, o sistema de preços estava sinalizando que os fatores de produção deveriam ser realocados de setores relativamente menos produtivos (algodão e açúcar), para setores mais produtivos (café). O problema, segundo Leff, é que, no caso brasileiro, esse processo foi excessivamente lento, o que prejudicou enormemente a economia nordestina. A causa dessa lentidão foi o simples fato de que o Brasil do século XIX não era economicamente integrado.
Assim como Summerhill, Leff destaca o problema do transporte na economia brasileira. A falta de sorte na geografia e as péssimas condições de estradas que conectavam as regiões brasileiras, tornavam o Brasil um país em que cada lugar tinha sua própria dinâmica econômica, com pouca relação com as dinâmica das demais. Nesse contexto, a existência de uma mesma moeda para todas as regiões pode gerar custos de ajustamento excessivamente altos. Como diz o próprio Leff:
Transferências de outros fatores produtivos de açúcar e algodão para café necessitavam de migração inter-regional. As grandes distâncias entre as regiões do Brasil, entretanto, significavam altos custos de transporte, de tal forma que migração envolvia investimentos.
Nathaniel H. Leff. Economic Development in Brazil, 1822-1913.
Sem mobilidade de trabalho, capital e bens entre duas áreas econômicas, a vigência de uma moeda única pode gerar mais custos do que benefícios. O motivo é simples, o preço da moeda muda mais rápido do que o preços dos outros bens. Nesse contexto, vale imaginar, como faz o autor, uma situação em que a região nordeste tivesse uma moeda diferente da moeda do sudeste. A expansão da exportação do café teria apreciado a taxa de câmbio real da região sudeste, mas não da região nordeste. A moeda do nordeste teria se desvalorizado frente a moeda da região sudeste. O declínio do algodão e do açúcar poderiam até acontecer eventualmente, mas a um custo econômico menor. Leff conclui:
As condições monetárias e comerciais da região [nordeste] foram enormemente agravadas pelo seu pertencimento a uma entidade política [o Brasil] que não atendia as condições mínimas para uma área monetária ótima.
Nathaniel H. Leff. Economic Development in Brazil, 1822-1913.
Muitas conclusões
A teoria de Leff sobre o nordeste está correta? O Brasil do século XIX não era uma área monetária ótima? Bem, é difícil dizer. Os dados desse período são escassos e, na história econômica, é difícil de construir contrafactuais. Uma pesquisa recente indica que haviam problemas maiores para o nordeste do que um câmbio apreciado e estradas ruins. O historiador econômico Thales Pereira escreveu um artigo no qual ele atribui a estagnação do algodão no nordeste a um problema de tributação. Grosso modo, a ideia é que o imposto de exportação era excessivamente alto e isso impedia novos investimentos na produção de algodão.
O que me parece fato é que a aplicação do conceito de “Áreas Monetárias Ótimas” para economia brasileira do século XIX é uma ótima forma de entender a teoria de Robert Mundell. Uma área monetária é ótimas quando o benefício adicional de aumentá-la (incluindo mais uma região ou país) é igual ao seu custo adicional. Como vimos, o benefício é a facilitação das trocas, redução dos custos de transação. O custo de ter uma moeda única é a perda da capacidade de absorver choques econômicos através do uso da própria moeda6. Esses custos são altos sempre que as economias forem pouco integradas e não existir livre mobilidade de pessoas, bens e capital.
Finalmente, estudando a história econômica brasileira, vemos que a geografia do nosso país foi um importante entrave para nosso desenvolvimento, especialmente no século XIX. As vastidão do território não propiciou os ganhos de escala e a especialização esperadas devido ao precário sistema de transporte. Há que se ter o cuidado, no entanto, em não adotar uma visão fatalista sobre o destino do nosso país. Dificuldades geográficas são superadas com tecnologia. Essa é a história da humanidade. Summerhill escreveu um livro inteiro a respeito de como as ferrovias modificaram decisivamente (para melhor) o destino da economia brasileira. O problema da geografia, portanto, pode ser agravado ou atenuado a depender de como utilizamos os recursos que temos. As ferrovias vieram tarde para o Brasil e sua presença foi provavelmente aquém do necessário. Por quê? Me parece que Edward C. Prescott oferece uma boa resposta em seu livro Barriers to Riches:
Nossa visão é que diferenças nas rendas internacionais são consequência das diferenças no conhecimento que sociedades individuais aplicam a produção de bens serviços. Essas diferenças não surgem por causa de uma diferença fundamental no estoque de conhecimento utilizável do qual cada sociedade pode se valer. Em vez disso, essas diferenças são o resultado primário de políticas específicas dos países, que resultam em restrições nas práticas de trabalho e na aplicação de melhores métodos de produção das empresas. Muitas dessas restrições, ou barreiras, são colocadas para proteger os interesses de grupos investidos no processo produtivo vigente.
Stephen L. Parente & Edward C. Prescott. Barriers to Riches.
É uma teoria interessante e um belo assunto para outro post.
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Livros e artigos citados:
A Theory of Optimum Currency Areas. Robert A. Mundell
Order Against Progress. William Summerhill
How Latin America Fell Behind. Stephen Haber (editor)
Taxation and the stagnation of cotton exports in Brazil, 1800–60. Thales Zamberlan Pereira
Barriers to Riches. Stephen L. Parente & Edward C. Prescott.
Ver episódio sete da oitava temporada para mais uma prova disso.
Segundo Summerhill, mulas eram o pilar do “setor de transporte” brasileiro. O engraçado é que, diferente de barcos e ferrovias, esse meio de transporte é um ser vivo, o qual precisa ser “criado” e não produzido. O autor descreve a situação curiosa:
Because of the strong demand for transport services and the derived demand mand for essential inputs, mule breeding came to be an important activity in Brazil. In the first half of the nineteenth century it became clear that securing ing an adequate flow of pack animals would prove to be an enduring problem. lem. Concern over the issue created quasi-official interest in arrangements to procure them. In the end, most mules appear to have been supplied by private vate entrepreneurs dedicated to provisioning the market. While mules were bred throughout Brazil, large-scale mule supply was concentrated in the far south. At mid-century Brazilians raised and drove to market tremendous herds of these animals, which were then sold to middlemen and muleteers in major hinterland entrepots such as Sorocaba, Sao Paulo. From there, the new owners dispersed the great herds through marketing networks, effectively tively scattering mules throughout the major agricultural regions, where they were employed in providing the transportation services so sorely needed throughout Brazil.
William R. Summerhill. Order Against Progress: Government, Foreign Investment, and Railroads in Brazil, 1854-1913. Edição do Kindle.
Imagine a quantidade de recursos destinada a criação desses animais. Terra, trabalho e capital que teriam usos muito mais produtivos não fosse a situação precária das estradas e ausência de malha ferroviária desenvolvida.
Maior do que a parte continental dos EUA, sendo que boa parte da diferença está no comprimento. O problema de ter um grande comprimento (medida no sentido norte a sul) é que você vai ganhar climas diferentes em cada latitude, o que, infelizmente, não é bom para ganhar escala na agricultura. Os EUA, por exemplo, são um retângulo cujo lado maior é a base, o que é bom para ganhar escala na agricultura.
Tente fazer seu próprio sanduíche sozinho. Eu não digo abrir a geladeira para achar presunto, queijo e manteiga, ou desatar o ferrinho encapado com plástico branco que prende a embalagem do pão. Tente fazer todo o seu sanduíche. Do zero. Plante seu trigo, mate o seu porco, faça o seu pão, ordenhe a vaca para conseguir o leite que vai virar a manteiga. Agora compare o custo disso com, sei lá, o preço do sanduíche em um supermercado. Melhor ainda: divida o seu salário pelo número de horas de trabalho e veja que, em apenas alguns minutos, você consegue fazer através do mercado um sanduíche muito melhor do que aquele que você demorou seis meses para você terminar (e que, com todo respeito, deve ter ficado uma bela porcaria). Agora entenda de uma vez por todas o que a especialização através do mercado nos propicia.
Aliás, foi uma dica do prof. Claudio Shikida. Leiam a newsletter dele.
Existem outros problemas ao se utilizar uma mesma moeda. Regiões com a mesma moeda, mas sem integração e coordenação da política fiscal também podem acabar mal. A Grécia se beneficiou enormemente do acesso a crédito barato fruto da integração ao mercado europeu e, principalmente, da inclusão na Zona do Euro. O governo grego aproveitou as condições favoráveis de crédito para se endividar e descumprir todas as regras de bom senso de política fiscal. Infelizmente, toda gastança desenfreada chega ao fim quando o mercado decide parar de financiar o governo irresponsável. O problema é que, nessa situação, a dívida grega não era denominada em uma moeda que ela controlava, cuja a qual ela poderia simplesmente começar a imprimir para “pagar” a dívida (o que provocaria uma hiperinflação, evidentemente).
A única saída para o governo grego era dar o calote ou tentar fazer um ajuste fiscal. O problema do ajuste fiscal é que ele é terrivelmente impopular e difícil de ser implementado em um país sem boas instituições (Ei! Estou falando da Grécia… Calma!). O problema do calote é que ela geraria uma crise bancária por toda Europa, pois os credores da dívida eram bancos importantes da França, Alemanha e Itália.
Sabendo que o calote exportaria custos para os demais países da Europa, a situação do governo grego era peculiar: ele poderia ameaçar dar calote e “sair do euro”, o que geraria uma crise financeira no continente, para conseguir negociar termos melhores no acordo de ajuste fiscal imposto como condição para receber auxílio financeiro da Alemanha União Europeia. O dilema alemão europeu em relação a Grécia também era interessante: se a Grécia for auxiliada com grana para pagar suas dívidas sem ter que fazer ajustes desconfortáveis, isso estimula outros países a seguir o exemplo da Grécia e sair gastando a vontade. É um problema interessante do ponto de vista estratégico.
Esse é o problema clássico de coordenação de políticas fiscais dentro de uma mesma união monetária. Ele existiu também na formação dos EUA e no Brasil durante os anos 90 com os bancos estaduais.